Em associação com Casa Pyndahýba Editora
Ano IV Número 50 - Fevereiro 2013

Ensaio - Ronald Augusto

The Critic, 1978 - William Ronald

Notas Precárias Sobre Fazer, Saber e Julgar

A atividade crítica, como há pouco escreveu o poeta Marcus Fabiano, mantém, sob certos aspectos, estreita analogia com a tarefa do jurado de qualquer prêmio ou concurso literário (advirto que esse comentário se restringe ao campo da literatura, mas pode-se aventar a hipótese de que o problema seria o mesmo se falássemos do ponto de vista de outra atividade artística). Mas num certo momento seus caminhos, o do crítico e o do jurado, se bifurcam.

O jurado, assim como o crítico, a partir de critérios principalmente estéticos (por agora vamos dizer que deveria ser assim) assume a responsabilidade de apontar dentre aquelas obras apresentadas à competição, as mais bem logradas a partir do que é específico dessa linguagem. Já o crítico, seja por seu próprio apetite, seja por dever de ofício, se dobra sobre a produção do presente e do passado e propõe leituras e análises (eu diria que se dispõe a uma interlocução) a propósito das valências compositivas desses exemplares e avalia, principalmente, os seus resultados artísticos, e, secundariamente, as tensões semânticas sugeridas.

Enquanto a decisão não vem a público, jurado e crítico estão seguros. “Deixemo-los lá, os dois, fazendo o seu trabalho de suma importância para continuação do sistema literário”. Tão logo o resultado, seja da análise, seja do julgamento ou da interpretação se torne conhecido, e esse resultado acaba por separar, sempre, os melhores dos piores, seu recorte passa a ser severamente criticado.

A diferença entre o jurado e o crítico é que este dá a ver publicamente não só as obras literárias bem logradas que teve sob seus olhos. O jurado, por sua vez, faz uma crítica indireta, quase apaziguadora de conflitos, pois oferece (por agora vamos aceitar que é assim) ao leitor modelos do que considera um bom ou excelente trabalho literário ou de arte. No caso dos prêmios e concursos, exceto se algum derrotado/excluído não vem a público para lançar dúvidas sobre a decisão do jurado, nem sabemos quem morreu no caminho. O silêncio entre desdenhoso e vaidoso como que deixa tudo em panos quentes e, aparentemente, todos concordam que a justiça foi feita. “Eu? Não, não mandei nenhum original para esse prêmio. Nem sei quem ganhou”.

Assim, o crítico, ao menos dentro das condições do presente, enfrenta e produz alguns problemas, vejamos: (1) se ele escreve a favor de determinado autor – ou seja, diz bem do seu trabalho, livro, poema, etc – não faz bem porque poucos sabem escrever “a favor” (sem tropeçar no compadrio) hoje em dia. De outra parte, essa ideia de “coletivo de escritores” reduz o “a favor” a um vergonhoso estilo laudatório que preserva mais o sujeito que elogia do que o elogiado, pois no momento seguinte o objeto dos confetes lançados terá de retribuir o gesto na mesma moeda. Escrever “a favor” (e as condições momentâneas apontam para isso) é quase sinônimo de relação corruptora.

E (2) se o crítico escreve contra, ele é um filho da puta (com o perdão da expressão, culto leitor) porque esse “coletivo de escritores”, todos eles conectados graças às redes sociais, esse coletivo de ativistas, forma um campo benfazejo onde se prosperou a ideia – inclusive para que ninguém sofra um surto psicótico – de que não existem mais bons nem maus escritores. O que importa é participar; ser um representante desse coletivo.